Projeto Ave Missões: Pesquisa, Educação Ambiental e Conservação com Aves da Região Noroeste do Rio Grande do Sul

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

195 belas desculpas para passarinhar no Turvo & na Guarita - 2017

Acauã no Turvo. Foto: Adaltro C. Zorzan.
* por Dante Andres Meller
Todo passarinheiro sabe que vale a pena ir a lugares remotos, enfrentar situações adversas, superar dificuldades etc. para encontrar os motivos que nos movem, que nos fazem vibrar.

Há quem diga que "stress é o que há entre uma passarinhada e outra", apontando, com tais palavras, o valor que a observação de aves tem.

Para alguns, é uma constante busca, para outros é um encontro com amigos; alguns o fazem pela oportunidade de entrar em contato com a natureza, outros para praticar a arte da fotografia; quem sabe estejamos todos à procura mesmo é de um outro mundo, um mundo mais belo, alegre e encantador...

Casal de joão-bobo (Nystalus chacuru) em ipê-amarelo florido no alojamento do Turvo. Foto: Ataiz C. de Siqueira.

Para apresentarmos o Turvo e a Guarita, é suficiente lembrar que a Mata do Alto Uruguai foi chamada de Amazônia gaúcha por naturalistas no passado. E quando assimilamos que onças e harpias ainda hoje vivem no Turvo, a comparação continua vindo a calhar. A Guarita, é claro, tem menos preservada sua mata, quando comparada ao Turvo, porém sempre reserva encontros especiais para nós passarinheiros, sem falar da acolhida que nosso grupo sempre teve dos amigos portelenses. Enfim, essa é uma saída sempre muito esperada...

Caburé (Glaucidium brasilianum) na Estrada do Salto. Foto: Adaltro C. Zorzan.



Grupo observando o caburé. Foto: Mariana F. Oliveira.

Primeiro dia

A aventura começou na quinta-feira pela manhã, quando alguns integrantes do grupo, já bem cedo no Turvo, começaram a desvendar os mistérios alados dessa que seria a saída anual mais rica em aves já feita por nós.

Conforme o dia ia passando, mais e mais integrantes se uniam ao grupo, e a lista de espécies também ia aumentando...

Tietinga (Cissopis leverianus) no PE do Turvo. Foto: Christian Beier.

Cauré (Falco rufigularis) no PE do Turvo. Foto: Adaltro C. Zorzan.

Pato-do-mato (Cairina moschata). Foto: Christian Beier.

Para encerrar o primeiro dia, uma rápida visita ao Salto do Yucumã, já que alguns ainda não o conheciam, enquanto outros queriam mesmo é matar a saudade! Pouco antes do Salto, porém, uma parada para ver um pica-pau-de-banda-branca fazendo seu ninho. Na volta da estrada também paramos para olhar uma arena de pavós, já nossa conhecida de outros anos.

Pica-pau-de-banda-branca (Dryocopus lineatus) no PE do Turvo. Foto: DAM.

Grupo visitando o Salto do Yucumã. Foto: Carlos Neimar Kuhn.

Pavó (Pyroderus scutatus). Foto: Christian Beier.

Segundo dia

A sexta-feira amanheceu com ares de boa passarinhada quando recebi de presente do amigo Carlos Neimar uma imagem de São Francisco de Assis, o santo dos passarinhos, trazida de Assis pelo amigo, o que me deixou muito alegre. Que Este o ajude no desafio de ser guarda-parque no Turvo!

Dito e feito... logo a seguir encontramos uma raridade no Turvo, o acauã, que estava pousado à beira do mato e tão logo avistado pelo amigo Cláudio Furini, nos entusiasmamos todos e "corremos" em direção do achado, que era lifer para muitos!

Acauã (Herpetotheres cachinans). Foto: Adaltro C. Zorzan.

Continuamos seguindo a dentro da estrada do Porto García, em direção ao Campestre. No caminho, além de toparmos com aves belas, como o surucuá-de-barriga-amarela (ou surucuá-dourado), também tivemos encontros apreensivos, como quando cruzamos o caminho de uma jararaca.

Surucuá-de-barriga-amarela (Trogon rufus). Foto: Márcia Koch.


Jararaca-verdadeira (Bothrops jararaca) na estrada do Porto García. Foto: Aquiles B. Naressi.

O Campestre é um local muito distinto em meio à floresta, com gramíneas, cactus e outras plantas características de formação aberta. É também ponto de referência para rapinantes, mas neste dia os ares simplesmente não estavam bons para voar, vai entender?! Então, enquanto fazíamos nosso piquenique, ouvidos atentos! porque a passarada estava sempre assobiando novidades. E foi assim que registramos o piolhinho-chiador e o balança-rabo-leitoso, ambos no mesmo momento e a poucos metros de altura. Eles que costumam ficar nas copas das árvores altaneiras, ali nos presentearam com rara "humildade", colocando-se mais próximo do chão do que o usual.

Piolhinho-chiador (Tyranniscus burmeisteri). Foto: Paulo B. Rodrigues.

Balança-rabo-leitoso (Polioptila lactea). Foto: Paulo B. Rodrigues.
Cactus no campestre. Foto: Ingrid Sessegolo.


Grupo reunido no campestre. Foto: Márcia Koch.

Se virtudes fossem pássaros, a humildade deveria ser um daqueles bem comuns, para sempre estar presente nas passarinhadas e na vida, pois tanto numa como noutra, as coisas tendem a sair diferentes do esperado e temos que aceitar nossa pequenez diante da grandiosidade da providência. Ok?! dessa vez ficamos sem águias florestais, paciência...

Voltamos para o alojamento numa espécie de fadiga que pegou a todos, inclusive suspeito que às águias também. Havia tempo para mais passarinhada, pois a tarde ainda tinha alto o sol que, com seu calor, nos convidava à sombra e água fresca. Decidimos ir até o Porto García, mas dessa vez não apé, o que rendeu para alguns conhecer o local e também novos lifers!

Porto García. Foto: DAM.

Viuvinha (Colonia colonius). Foto: Adaltro C. Zorzan.

Integrantes do Grupo reunidos no Porto García. Foto: Márcia Koch.

Aproximava-se o fim da tarde, enquanto voltávamos do local, e um o arapaçu-de-bico-torto nos chamava atenção, embora alguns forcejavam para que um dos carros subisse de volta. Antes que a sexta acabasse, ainda tivemos uma grande confraternização feita pelos amigos portelenses Cláudio e Jurema... Muito obrigado, estava tudo bom demais!

Terceiro dia

Certos momentos são únicos, mas bem que poderiam ser repetidos. Com as aves isso normalmente não acontece, especialmente em se tratando das espécies raras. Mas revisitar o Salto do Yucumã era perfeitamente possível... e lá fomos nós novamente!

Dessa vez passarinhamos ao longo do começo da estrada pela manhã, onde aparecerem muitas aves belas, como o araçari-banana, algumas dando boas chances para fotos, como a jacutinga e, claro, o fotogênico uirapuru-laranja, que será sempre um trunfo do Turvo na Mata Atlântica.

Jacutinga (Aburria jacutinga) na Lagoa das Marrecas. Foto: Ingrid Sessegolo.

Uirapuru-laranja (Pipra fasciicauda). Foto: Paulo B. Rodrigues.

À tarde, depois de um almoço na cidade, onde encontramos o estimado ornitólogo Glayson Bencke e sua esposa, voltamos para a estrada do Salto. O combinado era descermos direto até a área de lazer do Salto, mas paramos uma vez mais para ver o uirapuru, agora junto com o amigo Glayson, que observava com muita prudência essa pequenina preciosidade do Turvo.

Antes de chegarmos à área de lazer do Salto, tiramos tempo para fotografar um saci à beira da estrada. Já no destino, resolvemos fazer a Trilha das Onças, onde à beira de um pequeno riacho, um barbudinho garantiu o sucesso alado da tarde. Depois fomos novamente ver o Salto e se encerrava nossas atividades no Turvo, já que o dia seguinte estava reservado para a Guarita!

Saci (Tapera naevia) na Estrada do Salto. Foto: DAM.

Rã-das-pedras (Crossodactylus schmidti), espécie considerada em perigo na lista da fauna ameaçada de extinção do RS. Foto: DAM.

Barbudinho (Phylloscartes eximius). Foto: Paulo B. Rodrigues.

Quarto dia

Para alguns, o quarto dia começou já durante a noite de sábado, uma vez que o sítio do amigo Furini, à beira da Terra Indígena do Guarita, serviu de hospedagem naquela noite. Portanto, teve uma breve corujada, mas o melhor mesmo foi dormir ao som relaxante das águas do rio Guarita.

Amanheceu o domingo e toda a turma já estava reunida no sítio. Alguns optaram por uma passarinhada pacienciosa, na ceva que o amigo Furini preparou para os casos complicados de fotografar, exemplos: nambus, tovacas, pombas-rasteiras etc. Os que foram na ceva, foram bem sucedidos no quesito, conseguindo boas fotos da tovaca-campainha!

Tovaca-campainha (Chamaeza campanisona). Foto: Paulo B. Rodrigues.

Ceva preparada pelo amigo Furini para fotografia de aves. Foto: Márcia Koch.

O restante do grupo foi fazer a trilha, acompanhados pelo nosso anfitrião. Logo de cara, cantou, no mesmo lugar de sempre!, um gavião-de-cabeça-cinza, e a seguir sobrevoou nossas cabeças, momento em que rapidamente capturamos sua imagem. A seguir, passou voando um segundo indivíduo... pelo jeito é território de nidificação.

Gavião-de-cabeça-cinza (Leptodon cayanensis). Foto: Adaltro C. Zorzan.

Mal havíamos deixado o gavião (na verdade ainda o ouvíamos), quando um verdinho-coroado cantou, o que fez nosso anfitrião ficar todo animado, já que a espécie carecia de registro no Guarita, pelo menos no WikiAves. O pior foi que não deu foto, mas houve gravação sonora. Segundo o amigo Adaltro, a culpa foi do arapaçu-de-bico-torto, que passou bem na nossa frente na hora do lifer! Brincadeiras à parte, ele desviou mesmo nossa atenção, e o verdinho-coroado acabou ficando meio que à margem do registro...

Arapaçu-de-bico-torto (Campylorhamphus falcularius) na TI do Guarita. Foto: DAM.

Quase chegando de volta para aquele churrasco no sítio do amigo Furini, preparado pelo compadre César, tivemos mais um encontro daqueles de tirar o fôlego, dessa vez uma coral no meio do caminho... Pra finalizar a saída, um surucuá-variado, símbolo do grupo, veio dar as despedidas. Interpretações à parte, fico com a sensação de que em 2018 iremos voltar.

Coral-verdadeira (Micrurus altirostris). Foto: Christian Beier.

Grupo reunido no sítio do amigo Furini.

Surucuá-variado (Trogon surrucura). Foto: DAM.

Conclusão

Muito mais teve, do que não pude descrever, já que a lista foi grande, a maior já feita em uma saída com o nosso grupo, chegando a 195 espécies (veja lista!). Queríamos chegar a 200, faltou pouco, mas nem é preciso 200 razões para passarinhar no Turvo e na Guarita, bastam algumas poucas, como rever os amigos, conhecer novos passarinheiros, compartilhar momentos deslumbrantes com pessoas que até então só conhecíamos de nome, confraternizarmos e celebrarmos! Os passarinhos têm sido a bela desculpa para vivermos tanta riqueza, obrigado!

Foto: Adaltro C. Zorzan.

Um agradecimento especial a todos que participaram, em especial ao casal Cláudio e Jurema Furini, ao amigo Hannes, ao pessoal de Santa Maria: Aquiles, Mariana, Arlei etc., aos amigos Glayson e Jackie, a todos os funcionários do Turvo e à gestora Solange por autorizar nossa visita. Um grande abraço a todos! Se Deus quiser, em 2018 tem mais!

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10 comentários:

  1. Grande relato, Dante!! Seja qual for o motivo, nós voltaremos ao Turvo e à Guarita e seguiremos nosso destino de passarinheiros!!

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  2. Fantástico final de semana... fantástico reencontrar os amigos!!! Uma vez por ano é muito pouco...

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    1. Hehehe... é verdade Furini! Obrigado mais uma vez por tudo! Grande abraço

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  3. Grande post, parabéns! Incríveis registros e belíssimas fotos!

    Ass.:Lucas N. de Porto Alegre - RS

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  4. Que relato precioso! Obrigada, Dante e Ataiz, pelo carinho e por nos guiar mato adentro para ver o uirapuru-laranja, lifer do Glayson (e meu, lógico)! Deus queira que possamos fazer outras passarinhadas juntos!

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    1. Obrigado Jackie! Foi uma grande alegria compartilharmos momentos com vocês lá, que bom que conseguimos ver o uirapuru também! Tomara possamos fazer outras passarinhadas juntos sim, grande abraço!

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  5. Esses relatos passam exatamente a emoção de estar com vocês na passarinhada! Sensacional mesmo!! Esse ano se der tudo certo, conhecerei o Turvo! Parabéns pelo "trabalho" de vocês, são referência pra mim!! Show demais!

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    1. Obrigado pelas palavras Raphael! Espero que possas conhecer o Turvo logo sim! Grande abraço e boas passarinhadas por aí!

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