Projeto Ave Missões: Pesquisa, Educação Ambiental e Conservação com Aves da Região Noroeste do Rio Grande do Sul

domingo, 11 de agosto de 2019

Um gosto de ‘’quero mais’’

Piolhinho-verdoso.
Foto: Adaltro C. Zorzan.
*por Gabriel Brutti
Santa Rosa estava na agenda dos avemissioneiros para 2019, um grande prazer para nós conterrâneos poder receber o grupo em um dos lugares mais especiais que nossa terra reserva aos amantes da natureza, em especial aos observadores de aves.

Uma honra misturada com desafio para mim, Gabriel, ter a responsabilidade e a inspiração de descrever em palavras um momento tão especial vivido juntamente com os companheiros que migraram de Santo Ângelo a Santa Rosa domingo de manhã cedinho para nos acompanhar em mais uma aventura. 

O grupo ave missões foi recebido de braços, ou melhor dizendo, de asas abertas em nossa cidade.

Grupo Ave Missões visitando Santa Rosa. Foto: Márcia Koch.

Já havia levado nosso amigo Dante ao local para dar uma ‘’espiadinha’’ na área algum tempo atrás, a qual sempre se mostrou muito promissória em relação aos inúmeros registros que realizamos lá! Mais de 80 ha preservados pela família Silvério. Um verdadeiro refúgio para as nossas aves em meio à vasta monocultura regional. Lar de espécies interessantes como o uru (Odontophorus capueira), pica-pau-rei (Campephilus robustus), pica-pau-dourado (Piculus aurulentus), falcão-caburé (Micrastur ruficapillus) e até mesmo do majestoso pavó (Pyroderus scutatus), registrado a pouquíssimas semanas atrás.

Apesar de ter sido um dia marcado com boas previsões para o tempo, o sol demorou para mostrar as caras, o que nos fez mudar um pouco nosso percurso durante a manhã. Iríamos iniciar fazendo a trilha pela mata, mas optamos em começar a passarinhada pela sua borda, favorecendo assim a observação e a fotografia.

A manhã estava silenciosa e o ambiente qual percorríamos estava pouco movimentado, talvez até as aves haviam resolvido dormir até mais tarde. Caminhando pela borda, de longe avistamos uma cutia saindo da mata para buscar alimento, parecia que até os animais estavam com um pouquinho de frio e tímidos pela manhã.

Fragmento florestal na propriedade da família Silvério. Foto: Dante Meller.

De repente, surge um bando de maitacas que vocalizava fortemente, sobrevoando o fragmento em direção ao grupo, dando as boas-vindas para aos novos visitantes. Nós, como observadores, sempre atentos e com máquinas em mãos, conseguimos realizar alguns registros do bando em voo, antes de pousar na copa de uma árvore próxima a nós.

Maitacas (Pionus maximiliani). Foto: Adaltro C. Zorzan.

Caminhando mais à frente, próximo a um taquaral, nossos amigos Dante e Ataiz observaram um arapaçu-de-bico-torto (Campylorhamphus falcularius) na borda da mata, uma grande surpresa para nós, já que dificilmente observamos a espécie em lugares abertos. Neste momento, todo o grupo se reuniu para tentar fazer um registro, mas o bichinho não deu moleza. Entre as taquaras e as árvores ele se escondia muito bem, voava de um lugar para outro sem ao menos se mostrar para as câmeras. Nem mesmo o playback foi capaz de atraí-lo para fora, apenas vocalizava com seu potente canto, dizendo para nós que estava ali, mas que a foto ficaria para um outro momento.

No momento seguinte, ouvimos a corujinha caburé (Glaucidium brasilianum), que tentamos chamar para a borda da mata se sucesso. Depois, resolvemos adentrar seu território, mas novamente não tivemos sucesso em encontrá-la. O único registro que surgiu desta busca foi um arapaçu-verde, que veio nos conferir.

Arapaçu-verde (Sittasomus griseicapillus). Foto: Ademir Fick.


A floresta ainda se mantinha silenciosa e o sol parecia estar tímido para dar as caras, mas mesmo assim continuamos o nosso percurso, pois ainda tínhamos muito chão para caminhar, otimistas em rever alguma espécie já registrada por alí, ou até mesmo em realizar um novo registro.

Contornamos o fragmento e logo de cara observamos uma fêmea de surucuá-variado, pousada em seu poleiro, pronta para os observados, que não pouparam click’s. Apesar de ser uma espécie comum, é uma beleza de encher os olhos até mesmo para quem a encontra com frequência.

Surucuá-variado (Trogon surrucura) fêmea. Foto: Ademir Fick.

Aos poucos, a passarada estava começando a aparecer. No local haviam alguns gaturamos-rei vocalizando nas copas das árvores, também chamando o sol que ainda não tinha saído. Nem tempo de fazer uma foto deles deu, logo saíram dali, nos deixando prosseguir.

Não demorou muito para todo o grupo ficar ainda mais ‘’ligado’’ para o que estava nos chamando. Uma vocalização um pouco diferenciada nos chamou a atenção e nossos amigos experientes já sabiam de quem se tratava. Ave pequenininha, um pouco discreta, nos convidava a adentrar na mata. Resolvemos optar pelo playback, chamando-a para a borda e não demorou muito para dar o seu ‘’ar da graça’’. Se tratava do piolhinho-verdoso. Depois de observá-lo, entendi o porquê de seu nome popular. Um pouco tímido no primeiro momento, não nos proporcionou muitas fotos, mas foi o bastante para gravar seu melodioso canto. Foi o momento de euforia para registrá-lo, não deixando ninguém parado, aliás, não se tratava para nós de uma simples espécie, além de lifer para alguns, era um novo registro para a área. Um grande momento para mim e para os amigos Ademir e Débora, que já estamos passarinhando pelo local a mais de um ano juntos.

Agora sim a passarinhada estava começando a ficar interessante! Já que o piolhinho estava nos chamando, aderimos à sua proposta e entramos em uma estrada que atravessa uma parte do fragmento. Foi ali que ele resolveu posar por alguns minutos para as câmeras, nos dando a oportunidade de registrá-lo, não faltando click’s para o nosso modelo!

Piolhinho-verdoso (Phyllomyias virescens). Foto: Márcia Koch.

Com as cores contrastantes em meio à vegetação, destacava-se ainda a saíra-de-papo-preto, que também foi a modelo da vez, ‘’tomando’’ o seu café da manhã. Quetes-do-sul (Microspingus cabanisi), tico-ticos (Zonotrichia capensis), tiês-de-topete (Trichothraupis melanops) e sabiás também aproveitavam a grande oferta de alimento, preparando-se para o dia que estava por vir.

Saíra-de-papo-preto (Hemithraupis guira) macho. Foto: Gabriel Brutti.

No final do corredor, já demos de cara com a lavoura novamente, dando continuidade com um pequeno banhado, mas o caminho nos levaria a outro ponto, escondido dentro da mata, uma pequena lagoa, lugar onde geralmente se encontra o mergulhão-pequeno (Tachybaptus dominicus) e a saíra-viúva (Pipraeidea melanonota). Mas o caminho poderia se tornar ainda mais interessante, pois já havia registrado por algumas vezes o gavião-gato (Leptodon cayanensis) sobrevoando os arredores, mas infelizmente não se fez presente desta vez.

Os amigos Adaltro e Alfieri, por sua vez, resolveram ficar pelo caminho, insistindo em registrar uma borralhara-assobiadora que cantava por ali. Seguimos com o restante do grupo e a trilha que havíamos feito a algum tempo atrás ainda se mantinha boa para o percurso, apesar de ser curta, poderia nos revelar alguma surpresa. Vistoriamos a pequena lagoa, que para nossa surpresa, se apresentou deserta de aves. Logo escutamos um bater na madeira, pensamos ligeiramente em ser o pica-pau-rei, já que tínhamos encontrado e registrado a espécie a algum tempinho atrás, mas o frio na barriga durou pouco, se tratava mesmo de um pica-pau-de-banda-branca, que também estava aproveitando o momento para se alimentar.

Pica-pau-de-banda-branca (Dryocopus lineatus). Foto: Dante Meller.

No caminho de volta, havia um gavião-de-cauda-curta realizando seu voo matinal. Reencontramos também os amigos que haviam ficado para trás tentando registrar a borralhara-assobiadora. E não é que rendeu um lifer fotográfico para o amigo Adaltro, que conseguiu fazer o registro, mas, segundo ele, deu um trabalho esse um registro... A seguir foi a vez do amigo Ademir também tentar e conseguir.

Gavião-de-cauda-curta (Buteo brachyurus). Foto: Dante Meller.

Borralhara-assobiadora (Mackenziaena leachii) macho. Foto: Ademir Fick.

Resolvemos retornar, agora o sol já havia saído e seria um bom momento para fazermos a trilha, já que as condições de luminosidade estavam favoráveis para entrar na mata, podendo fazer bons registros fotográficos.

Voltamos ao ponto de partida, seguimos apresentando a grande área ao grupo, podendo passar por diversos ambientes bem peculiares, mas neste dia, as aves pareciam estar tímidas, vocalizando e se movimento pouco nas proximidades.

Caminhando pela trilha, o amigo Dante escutou o que poderia ser o gavião-gato vocalizando um pouco distante, mas como a vocalização foi breve, não confirmamos o registro. Durante o percurso, um bando misto se mostrou aos observadores, com algumas espécies como tecelão (Cacicus chrysopterus) e saíra-viúva. Também foram ouvidos o tiê-de-bando (Habia rubica) e a tovaca-campainha (Chamaeza campanisona). Finalizamos a trilha e saímos para ir de encontro ao sol. Já era quase meio dia. Incrível como o tempo voa quando estamos entretidos naquilo que gostamos.

Estávamos quase nos despedindo, mas ouvimos alguns fim-fins (Euphonia chlorotica) em meio às ervas de passarinho no alto de um cinamomo. Escutando melhor, não estavam sozinhos, havia um casal de gaturamos-bandeira se alimentando também. Apesar da dificuldade de se observar a espécie em meio à planta, conseguimos registrá-la!

Gaturamo-bandeira (Chlorophonia cyanea) macho. Foto: Dante Meller.

Como observadores de aves não vivem apenas de lifers e bons registros, igual aos gaturamos e aos fim-fins, era hora de almoçar, e esta foi a deixa do grupo a Santa Rosa. Apesar dos interessantes registros realizados na manhã de domingo (veja lista), a passarinhada ficou com um gostinho de ‘’quero mais’’, já estendendo o convite aos avemissioneiros a retornarem a este refúgio da vida silvestre que ainda nos revelará belas surpresas.

Até breve.

Grupo Ave Missões em Santa Rosa. Foto: Márcia Koch.
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3 comentários:

  1. Excelente relato!! Foi um prazer finalmente conhecer esse local que já rendeu tantos belos registros!! Certamente voltaremos!! Grande abraço e parabéns pelo post!!!

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  2. Ótimo post, parabéns! Espécies interessantes e bonitas imagens!

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  3. Parabéns, uma foto mais linda que a outra! Parabéns pelo trabalho!

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