Projeto Ave Missões: Pesquisa, Educação Ambiental e Conservação com Aves da Região Noroeste do Rio Grande do Sul

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Ainda existe um lugar...

No último fim de semana partimos em breve expedição à algumas localidades no interior da região das Missões. Primeiramente, saímos de Santo Ângelo - onde vimos dois falcões-peregrinos ao redor da torre central da cidade pelo amanhecer - após fomos em direção à Cerro Largo, onde fomos bem recebidos e guiados pela bióloga Adelita Rauber. Já na casa da Adelita, no distrito de São Franciso, a primeira surpresa: uma maria-cavaleira (Myiarchus ferox). Esta vocalizou e foi atraída pelo playback e, então, fotografada. Belton (1994) citou apenas um registro da espécie para o RS, sendo uma espécie difícil de ser diferenciada, senão pelo canto, do irré (Myiarchus swainsoni) – espécie mais comum no Estado.

Maria-cavaleira. foto: D. Meller.

Deste local fomos à UHE São José, construída no Rio Ijuí. Do outro lado da usina chamava atenção a quantidade de campos e matas nativas aparentemente preservadas, no município de Rolador, sugerindo pesquisas no local. Na área da usina vimos, além de aves aquáticas, como o biguatinga (Anhinga anhinga), um falcão-peregrino (Falco peregrinus) e uma guaracava-de-crista-alaranjada (Myiopagis viridicata), que vocalizava seu típico “peue” na borda de uma mata.

Tiê-tinga. Espécie ameaçada de extinção no RS. Foto: D. Meller.

Beija-flor-de-veste-preta macho. Foto: D. Meller.

Após, guiados pelo biólogo Carlos N. Kuhn, nos dirigimos a São Paulo das Missões, sua terra natal. Lá, além da ótima recepção e cafés coloniais, também tivemos registros importantes. No pátio da casa do Carlos, enquanto fotografávamos um beija-flor-de-veste-preta (Anthracothorax nigricollis), dois tiês-tinga (Cissopis leveriana) – espécie ameaçada de extinção no RS - pousaram em árvores frutíferas, dando oportunidade para serem fotografados. Mais tarde vimos também aves mais comuns, mas ainda assim interessantes, como jacuaçus (Penelope obscura), um surucuá-variado (Trogon surrucura) e um gaviãozinho (Accipiter striatus).

Gaviãozinho jovem. Foto: D. Meller.
Surucuá-variado macho com troca de plumagem nas retrizes. Foto: D. Meller.

Ao cair da tarde tivemos outras surpresas: Primeiro ouvimos uma tovaca-campainha (Chamaeza campanisona) e depois vimos e fotografamos uma fêmea do anambé-branco-de-bochecha-parda (Tityra inquisitor) e um macho da saíra-de-chapéu-preto (Nemosia pileata), tudo no alto de um morro onde havia um trecho de matas preservadas. A saíra-de-chapéu-preto consta com pouquíssimos registros no RS, muito provavelmente, devido à falta de pesquisas na região noroeste do estado. Na descida ainda vimos um bico-virado-carijó (Xenops rutilans). À noite passamos pela igreja da localidade Pinheiro Machado e registramos um casal de corujas-de-igreja (Tyto alba) que estavam bastante ativas.

Coruja-de-igreja. Foto: D. Meller.
Saíra-de-chapéu-preto macho. Foto: D. Meller.
Anambé-branco-de-bochecha-parda fêmea. Foto: D. Meller.
Pela manhã do outro dia decidimos ir ao Cerro do Inhacurutum, no município de Roque Gonzales. Este local é conhecido por ser o ponto mais alto da região. Lá de cima, no alto de um mirante construído por famílias locais, pode-se enxergar o horizonte ao longe em todas as direções. É um belo observatório para aves de rapina. Mas destas só vimos urubus-de-cabeça-preta e vermelha (Coragyps atratus e Cathartes aura), gaviões-carijó (Rupornis magnirostris) e um gavião-caboclo (Heterospizias meridionalis). Mas vale a pena estar atento, pois na província de Corrientes (Argentina), a qual não fica longe dali, existem registros de espécies raras e algumas de ocorrência incerta em território gaúcho. Lá de cima ouvimos o joão-bobo (Nystalus chacuru) e alguns inambus-xintã (Crypturellus tataupa) e também um outro inambu, talvez Crypturellus obsoletus.

Cerro do Inhacurutum em Roque Gonzales, RS. Foto: D. Meller.
Em cima do mirante observando as rapineiras.
No fundo um urubu-de-cabeça-vermelha. Foto: Luana Almeida 
Ao fim de tudo nos restou a gratidão pela hospitalidade com que fomos recebidos por este simples povo alemão que habita o interior da região. A quantidade de matas que ainda existe na região também nos agradou muito. Ainda que fragmentada, a região preserva muito vegetação por causa do relevo levemente acentuado que não permite o uso extensivo da agricultura, preservando o topo dos morros, diferente da região de Santo Ângelo, por exemplo. Além dos registros e fotos interessantes, trouxemos em nosso coração e memória coisas ainda mais importantes. Para isto expressar, faço aqui uso das palavras do cantor nativista Wilson Paim em sua música, Ainda existe um lugar: 

“Venha sentir a paz que existe aqui nos campos / O ar é puro e a violência não chegou / O céu bem limpo e muito verde pela frente / Uma vertente que não se contaminou / ... Aqui a verdade ainda reside em cada alma / Se aperta firme quando alguém lhe estende a mão / Se dá exemplo de amor, fraternidade / Aos da cidade que nem sabem pra aonde vão..."

Adelita Rauber. Foto: Luana Almeida.
Por Dante Meller, Luana Almeida, Adelita Rauber e Carlos Neimar Kuhn.

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6 comentários:

  1. aieeee...

    é tao bom ler isto..
    saber que nao estamos sozinhos, que existem sim pessoas engajadas e preocupadas com o meio ambiente!!!

    e sim..a regiao noroeste, ainda, tem muita diversidade..

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  2. Foi uma expedição maravilhosa...
    Resgatou o sabor da infância na busca pelas corujas em meio à escuridão da noite... E trouxe o gostinho saborosa da vida no campo!!!
    Um final de semana com tantas lições de vida quanto lições de ornitologia!
    As maravilhas da natureza sempre adoçam o coração!

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  3. Que legal, gente. Boas notícias vindas do nosso interior. E parabéns pelo blog, vou voltar mais vezes aqui.

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  4. A hora que quiserem retornar é só dar um grito, será um prazer. E tem que vir aqui pra Triunfo agora também. Abraços.

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  5. Valeu, pessoal. A presença de vocês, ainda que virtual, traz mais alegria ao blog.

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